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06/12/2021 - 08h57

De Popa a Proa: Perspectivas em tempos de facilitação do comércio

Fonte: A Tribuna On-line / Angelino Caputo*
 
Segundo os normativos aduaneiros brasileiros, um recinto alfandegado é um local declarado pela Receita Federal do Brasil para que nele possa ocorrer, sob controle e fiscalização aduaneira, a movimentação, armazenagem e liberação de mercadorias procedentes do exterior ou a ele destinadas. Participam desse controle aduaneiro das cargas: as Alfândegas da Receita Federal, o Mapa/Vigiagro, a Anvisa e o Ibama, dentre outros órgãos públicos.
 
Historicamente os recintos alfandegados eram áreas delimitadas nos pontos de fronteira do País, presentes nas fronteiras terrestres, nos aeroportos internacionais ou nos portos. Esses pontos de fronteira são conhecidos como “zona primária” do território aduaneiro, enquanto todo o resto de território brasileiro é conhecido como “zona secundária”.
 
Na década de 1970 surgiu a figura do Porto Seco, ou EADI (Estação Aduaneira do Interior), um local igualmente alfandegado, porém localizado longe dos pontos de fronteira, na zona secundária do nosso território aduaneiro. Imaginava-se com isso conciliar as facilidades logísticas desses locais com os necessários controles aduaneiros para as cargas do comércio exterior.
 
Usando-se do mesmo conceito, começaram a surgir, na década de 1980, com destaque para o Porto de Santos, os terminais retroportuários alfandegados. Nesse caso, a principal motivação não era propriamente aproveitar as localizações do interior do País, próximas às rodovias, para se criar centros de distribuição de cargas, mas sim desafogar os pátios de carga e descarga dos navios, uma vez que as mercadorias ainda não liberadas pelos órgãos fiscalizadores cresciam em escala acelerada, chegando mesmo a atrasar a atracação de outros navios por falta de espaço na área do cais.
 
Vale dizer que os recintos retroportuários alfandegados, que hoje complementam com louvor a operação portuária, nasceram de uma ineficiência processual, já que a necessária fiscalização das cargas demandava área para essa atividade e os processos muitas vezes eram morosos e feitos de forma rudimentar, in loco, abrindo-se a maior quantidade possível de contêineres e outras embalagens.
 
Hoje vislumbra-se uma realidade bastante diferente. Muita tecnologia, inteligência artificial, algoritmos de gestão de risco e processos automatizados foram e estão sendo rapidamente incorporados à fiscalização das cargas, de forma que elas não precisarão mais, em muito curto prazo, ficar fisicamente retidas nas áreas portuárias ou retroportuárias aguardando a fiscalização dos órgãos anuentes. Já é possível mesmo a liberação aduaneira das cargas de importação antes mesmo do navio atracar no porto, no conhecido “despacho sobre águas”.
 
Isso tudo catalisado pela adesão do Brasil ao AFC (Acordo de Facilitação do Comércio), da OMC, criado na reunião interministerial de Bali em 2013, na qual os países membros selaram um pacto mundial pela desburocratização e aceleração do fluxo do comércio mundial.
 
Liga-se então um sinal amarelo para os atuais recintos alfandegados portuários, cujo modelo de negócio surgiu de uma ineficiência fisca-lizatória e que agora podem simplesmente desaparecer com a modernização intensiva desse processo. Chegou a hora de invocar aquela conhecida máxima do mundo empresarial da reinvenção do negócio, agregando valor para os importadores além da simples armazenagem à espera da fiscalização. Nesse cenário, oferecer melhores conveniências logísticas, a separação e embalagem dos produtos, acondicionamentos especiais e até mesmo a entrepostagem industrial portuária, transformando os atuais recintos em verdadeiras fábricas para seus clientes, entra na pauta e no planejamento estratégico dessas áreas tão importantes para nossa cadeia logística.
 
*Angelino Caputo é diretor-executivo da Associação Brasileira dos Terminais e Recintos Alfandegados (Abtra)
 
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