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04/07/2018 - 04h39

Decisões erradas para portos e logística: incompetência ou má fé?

Fonte: Jornal da Orla / Sérgio Aquino


 
Quando se analisam as decisões de governos em nosso país, não se encontra dificuldades em listar uma série de infelizes situações, em todos os níveis da esfera pública. Não há exclusividade para os governos federal, estaduais ou municipais. Aliás, a população fica com a impressão de que, em muitos casos, as administrações municipais se apresentam como o nível fundamental da incompetência, que se aperfeiçoa nos níveis estaduais e chega à extrema perfeição errática no nível federal.
 
Também não se pode excluir a responsabilidade da população, que, eleição após eleição, se aperfeiçoa em continuar recolocando nos postos eletivos, em grande parte, os mesmos grandes mestres das decisões incorretas, inadequadas ou altamente suspeitas em seus reais objetivos. Esta verdadeira democratização da cultura dos erros, presentes em todos os níveis do poder público, também se apresenta disseminada em todos os segmentos que pudermos analisar.
 
Desta forma, o segmento logístico e portuário não conseguiria passar imune de tal infeliz característica nacional.
 
A gritante capacidade do poder público federal de produzir erros incomensuráveis no setor portuário se apresentou na edição da Medida Provisória 595.
 
No lugar de aperfeiçoar a lei de modernização portuária de 1.993, resolvendo o conflito com as cargas de terceiros e facilitando a implantação de portos privados, a MP jogou no lixo o modelo correto e implantou um marco regulatório contrário às melhores práticas mundiais.
 
No segmento portuário, a característica de optar pelo caminho contrário às melhores práticas mundiais, também se apresentou recentemente na decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), que, tacitamente, revogou parcialmente o Decreto 9.048 do governo federal. Tal instrumento buscava corrigir parte dos erros daquela Medida Provisória. 
 
Este tradicional atributo das decisões incorretas chega a atingir características de irracionalidades e cenários tragicômicos. Recentemente, fomos sacudidos com a denominada greve dos caminhoneiros, que efetivamente paralisou o país de norte a sul e leste a oeste, despertando os debates para a excessiva dependência brasileira em relação ao modal rodoviário. Inúmeros analistas salientaram a inadequada matriz de transportes do Brasil. Vários estudos técnicos demonstravam, por meio de números, gráficos e estatísticas, estes cenários da inadequada dependência do modal rodoviário brasileiro.
 
Recentemente, a Fundação Dom Cabral, por meio do trabalho denominado "Diagnóstico e Projeções para a Infraestrutura de Logística de Transportes no Brasil", também divulgou números alarmantes: o transporte rodoviário responde por 52% das cargas movimentadas, enquanto o modal ferroviário participa com 27%, o aquaviário com 17% e o dutoviário com apenas 3%. Com tais diagnósticos, grande parte dos brasileiros passaram a ser especialistas logísticos, debatendo soluções para alterar tal inadequada matriz de transportes. Como tradicionalmente também nos apresentamos como grandes técnicos futebolísticos, da economia e da política, as soluções para a matriz de transportes incorreta passou a ser tema do cotidiano.
 
Uma questão virou consenso: O governo precisa incentivar os demais modais de transporte e investir em infraestrutura, para reduzir a dependência do modal rodoviário.
 
Mas no Brasil, para manter a tradição, o governo seguiu o caminho inverso. No lugar de incentivar os transportes ferroviário, aquaviário e o sistema portuário, elaborou uma Medida Provisória e trabalhou fortemente no Congresso para garantir que somente o transporte rodoviário continuasse com o direito da desoneração sobre a folha de pagamento. Os demais modais e o sistema portuário sofreram elevação de seus custos, portanto, foram desestimulados, quando deveriam estar recebendo benefícios.
 
Não importa se tais medidas erráticas são tradicionalmente adotadas por incompetência, má fé ou outra motivação. A triste realidade é que estas decisões incorretas passam desapercebidas, não havendo cobranças sobre os governantes que as adotaram e continuamos vivendo os tristes atuais cenários de nosso país.
 
Precisamos combater os erros irresponsáveis, que prejudicam o sistema portuário, em especial porque esta é a principal atividade de nossa cidade e região. É imperioso mudar a tradição de passividade nacional. No lugar de tentar classificar a natureza dos erros, vamos alardeá-los e combatê-los. O sistema portuário também precisa contar com a desoneração da folha de pagamento. Não garantir tal redução de custos é muito mais do que um simples erro: é um crime contra a competitividade logística brasileira e contra as cidades portuárias.
 
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