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27/07/2015 - 05h41

Navio polui o mesmo que 50 milhões de carros - mas tem jeito

Fonte: Associação Nacional de Transportes Públicos / Olimpio Alvares (*)

 
Segundo artigo do The Guardian, um recente estudo indicou que um navio cargueiro pode poluir o mesmo que cinquenta milhões de carros. Independentemente da precisão do estudo e da real grandeza do fenômeno, o problema tem jeito, mas dá um pouco de trabalho a quem de direito - e isto parece ser o "xis" da questão. Ainda bem que esses monstros sujos não navegam o tempo todos pelas ruas das cidades junto da população, que já respira altíssimas concentrações de poluentes, adoece e morre precocemente por causa disso - estudos científicos que comprovem a mortandade não faltam.
 
Cientes do desafio, as agências ambientais no mundo desenvolvido estão avançando aos poucos com a regulamentação de controle de emissões de propulsores novos nos setores marítimo e na aviação, mas isso somente terá efeito positivo ao longo de décadas. As tecnologias para redução das emissões mais críticas - material particulado fino (MP), declarado recentemente carcinogênico pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e os óxidos de nitrogênio (NOx), irritantes e precursores da formação do ozônio (O3) - são similares às conhecidas estratégias largamente utilizadas nos veículos terrestres a diesel: injeção eletrônica; maiores pressões de injeção; sistemas de recirculação dos gases de escapamento (EGR); pós-tratamento dos gases de exaustão com catalisadores (Catalisador de Oxidação e SCR, à base de uréia) e filtros de material particulado (DPF); diesel de baixo teor de enxofre; e substituição do diesel por gás natural liquefeito (GNL) queimado em motores dedicados (Ciclo Otto) ou nos mesmos motores (Dual Fuel) junto com o diesel.
 
Aqui no Brasil, nada é feito nessa seara - nem pensado; e também na área dos milhares de motogeradores e motores de combustão estacionários - esses, prioritários, porque operam em áreas urbanas densamente povoadas, especialmente nos horários de pico, quando a tarifa horo-sazonal de energia elétrica da rede pública é mais cara para desestimular o consumo - fica mais barato gerar energia com diesel nessas horas. Tem até uma recente lei municipal em São Paulo obrigando todos os motogeradores a diesel da cidade a adotarem filtros ou combustíveis menos poluentes, mas essa lei - assim como outras leis ambientais similares que "não pegam no breu", como a inspeção veicular ambiental - não está sendo cumprida, e parece que o Poder Público Municipal não está fiscalizando seu cumprimento (no caso, não-cumprimento).
 
Enquanto as regulamentações dos navios e aviões não avançam e assim, não surtem impactos positivos na qualidade do ar, algumas medidas simples de mitigação de emissões de material particulado fino do diesel poderiam ser tomadas por aqui em áreas sensíveis, muito poluídas, e em balneários turísticos - mas, por enquanto, não são. Nem nas balsas do Guarujá, por exemplo: elas operam com motores marítimos a diesel, que poderiam ser equipados com eficientes DPFs - os filtros de material particulado adaptados (retrofits) - simples, baratos, duráveis, de fácil manutenção e com eficiência de filtragem de mais de 95%. Eliminam o problema, simplesmente! Mas, desafortunadamente, não há em nossa frustrante realidade ambiental qualquer medida de controle dessas emissões. Na mais otimista das hipóteses, esses motores, assim como os que movem os ônibus urbanos e motogeradores, tem apenas uma manutenção cuidadosa ou usam um diesel de melhor qualidade com baixo teor de enxofre - o que não resolve totalmente o problema do material particulado nanométrico e das dezenas de milhares de mortes anuais a ele atribuídas, só no Estado de São Paulo.
 
Os filtros adaptados nas balsas, ônibus urbanos e motogeradores a diesel são, de certo modo, uma ferramenta simples à mão das autoridades ambientais e de transportes; essas poderiam, com um esforço mínimo - assim como fazem muitos países - oferecer aos seus cidadãos um meio de transporte limpo e decente, especialmente nas áreas congestionadas e turisticamente sensíveis, como a travessia Santos-Guarujá. Os usuários das balsas veem e respiram a fumaça - e até chegam a reclamar dela às autoridades - mas, nada ainda foi feito para eliminar de vez essa horrível e mal cheirosa fuligem.
 
De um modo geral, pode-se dizer que precisamos ainda evoluir na área da cidadania sustentável - e com urgência!
 
Leia o artigo do Estadão, que cita dados do The Guardian

 


 
(*) Olimpio Alvares é engenheiro mecânico, ex-gerente da Cetesb, Diretor da L`Avis Eco-Service - Transporte Sustentável e Emissões Veiculares e é membro fundador da Comissão de Meio Ambiente da ANTP
 
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