Fonte: Valor Econômico


 

Um dos desafios das empresas brasileiras e latino-americanas para internacionalizar as operações é superar o gargalo da qualificação da mão de obra. Com oito escritórios na América Latina e clientes de diferentes portes e setores, a Cia de Talentos estrutura dezenas de programas de estágios, trainees e MBAs corporativos para empresas que atuam na região. No ano passado, houve a adesão de 1,3 milhão de universitários inscritos nos programas voltados para jovens sem experiência profissional. "Apesar de tantos candidatos, não conseguimos preencher oito mil posições, sendo que, em algumas vagas, a procura era de dois mil candidatos por vaga", afirma Sofia Esteves, fundadora da DRM e da Cia de Talentos.

 

Em alguns empregos, a faixa inicial de salário oscilava entre R$ 4,5 mil a R$ 6 mil mensais, na participação de um programa de dois anos para que o estagiário desenvolvesse sua capacidade no ambiente corporativo. "Cerca de 70% da receita na região são oriundos de empresas internacionalizadas, que enfrentam o problema de preencher seus quadros", destaca a executiva. Para ela, não é tanto a qualificação técnica que impede a contratação, mas a falta de ambição e vontade dos jovens que procuram seu primeiro emprego. "Cresce a percepção de que ser empreendedor é melhor e está mais ligado aos ideais da nova geração."

 

Para Jacques Marcovitch, ex-reitor da Universidade de São Paulo (USP), a educação é uma questão nevrálgica a ser resolvida na América Latina, onde metade da população tem menos de 30 anos. "É preciso repensar a sala de aula, para que ela se transforme em um espaço de construção do conhecimento, de valores, de projeto de vida e crie relações sociais que as redes sociais não permitem", diz. 

 

A criação de líderes parte de um ambiente diferente nas salas de aula, em que devem ser discutidos temas, como a retomada da economia dos Estados Unidos, o crescimento urbano da China, as repercussões do atentado do Estado Islâmico na França. "Estamos em uma nova era em que existem e oportunidades e isso precisa ser refletido", observa. 

 

Entre as oportunidades, segundo ele, estão o fato de que, até 2030, o mundo deverá ter dois bilhões de pessoas a mais, e dois terços irão residir em zonas urbanas. A produção mundial de alimentos, em que o Brasil e a América Latina tem destaque, terá de dobrar para atender ao acréscimo populacional e aumento da renda nas nações emergentes. 

 

Para Marcovitch, a alteração da estrutura das salas de aula está em linha com outra questão: qual país queremos nos próximos anos? Essa pergunta se torna ainda mais complexa com recentes notícias vindas dos quatro cantos do mundo. Ao lançar seu plano quinquenal, a China eliminou a política de limite de filhos, concedendo maior liberdade às mulheres. O crescimento se pautará pela inovação e a moeda chinesa deverá ter maior inserção, se tornando a quarta mais convertida no mundo. "A China vai aumentar sua presença e vai agregar mais valor aos seus produtos. E nós, onde estamos?"

 

Já os EUA preparam uma mudança de sua política monetária. Pela primeira vez desde a crise financeira mundial de 2008, o Banco Central americano deverá elevar os juros em 0,5 ponto percentual até o fim do ano, enquanto analistas projetam que a taxa deverá encerrar 2016 em 1,5 ponto percentual. "Isso traz uma mudança drástica para os emergentes, mas qual é o nosso projeto? Os líderes de amanhã têm de ser forjados com base nessas discussões."

 

Para Miguel Dau, diretor de operações da GRU Airport, concessionária do Aeroporto de Guarulhos, concedido em 2012 pelo governo federal, a mão de obra é um dos desafios que o setor tem nos próximos anos. "Com as novas concessões que deverão ser feitas, já antevejo dificuldade em formação de mão de obra qualificada", afirmou. O governo federal trabalha para licitar, provavelmente, no próximo ano, quatro novos aeroportos para a iniciativa privada: Salvador, Florianópolis, Porto Alegre e Fortaleza.