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20/04/2022 - 10h55
Incentivo anima setor
Fonte: Revista setorial de logística do Valor Econômico
Não bastassem dois anos de pandemia com a desorganização de toda a logística marítima global, o setor portuário se vê agora sob o impacto da guerra no Leste Europeu, cujos reflexos já são percebidos na disparada dos preços do petróleo e na escassez de produtos, como fertilizantes, com o risco de afetar as commodities agrícolas. Fretes mais caros e prazos mais longos para importar componentes da China também afetam diversas indústrias, como a de eletroeletrônicos.
Isso após um período que já dava sinais de que as coisas entrariam nos eixos. Dados da Antaq mostram que o setor portuário cresceu 4,8%, movimentando 1,210 bilhão de toneladas de cargas em 2021. Para 202, a agência projeta a movimentação de 1,239 bilhão de toneladas, com expansão de 2,4% sobre 2021.
Os avanços no setor têm sido grandes. Dos 36 portos públicos, 17 são companhias Docas que, em 2022, iniciam o processo de privatização pela Codes e por Santos. De acordo com o Ministério da Infraestrutura, foram concedidas, nos últimos dois anos, 27 autorizações, com R$ 8,8 bilhões de investimentos, e foram licitados 20 arrendamentos, sendo oito em 2020 e 12 em 2021, com arrecadação de R$ 1,41 bilhão em outorgas e estimativa de investimentos de R$ 4,45 bilhões. Para 2022, estão previstos 21 leilões, demandando R$ 11,93 bilhões de investimentos. Desde 2014, foram realizadas 19 prorrogações antecipadas de contratos, com investimentos de R$ 8,7 bilhões, e duas estão em análise.
As entidades do setor comemoram a derrubada do veto presidencial à extensão do Reporto, criado em 2004 e expirado em 20220. O benefício agora terá validade até fim de 2023. A renovação do Reporto é importante neste momento pós-pandemia e demanda por eficiência”, diz Eduardo Nery, diretor-geral da Antaq. A ABTP estima que R$ 2 bilhões em investimentos estavam represados. Caio Morel, diretor-executivo da Abratec, diz que o fim do Reporto oneraria os equipamentos em 42%.
Antônio Carlos Sepúlveda, presidente da Santos Brasil, calcula que a oneração fiscal dos investimentos comprometidos na renovação antecipada do contrato assinada em 2016 seria de R$ 300 milhões caso o Reporto não fosse renovado. “Quem venceu não foram os terminais, mas o comércio exterior brasileiro”, diz o executivo.
Cássio Schreiner, presidente do porto Itapoá, em Santa Catarina, diz que encomendou seis RTGs (equipamentos de movimentação), a serem entregues no fim do ano e quer ampliar de seis para 13 portêineres (guindastes para movimentação de contêineres), que vão exigir outros 21 RTGs, num investimento total de US$ 110 milhões. “Sem o Reporto, o valor subiria para US$ 150 milhões”, diz Schreiner.
Ricardo Arten, CEO da BTP, observa que a empresa está com o pedido de prorrogação do contrato em análise, com investimentos de R$ 1,4 bilhão, a maior parte para aumentar a base de equipamentos, mas não considerou o Reporto. “Com a renovação do Reporto, a diferença a mais será usada em novos investimentos”, explica.
O Super Terminais, um dos maiores terminais de uso privado (TUPs) de Manaus, também não considerou o Reporto nos investimentos de R$ 200 milhões, que incluem a aquisição de três guindastes MHC Super Post Panamax. “Essas aquisições contam com incentivos da região”, destaca Marcello Di Gregório, diretor do Super Terminais.
Paulo Bertinetti, diretor-presidente do Tecon Rio Grande, diz que já tem prevista a aquisição de mais três portêineres para 2024. “Mas são investimentos que dependem da conjuntura”, ressalva. A empresa fechou o ano com 666 mil TEUs (medida equivalente a um contêiner) de capacidade e 1,3 milhão de TEUs, em linha com 2020, e estava se movimentando para crescer em 2022, quando veio a guerra na Ucrânia, que deve afetar as exportações de proteína animal da região Sul.
Para Larry Carvalho, especialista em transporte marítimo, há desde 2009 um descompasso entre a oferta de tonelagem de navios e a demanda de fretes que a guerra impacta. “Na logística, o Mar Negro e o Mar de Azov – entre a Ucrânia meridional, a Crimeia e o vale do rio Kuban – foram apontados pelas seguradoras como áreas de terrorismo, majorando o prêmio das apólices de seguros. No comércio, muitos países da região estão sem abastecimento. E a alta do petróleo impacta o valor do frete”, analisa Carvalho.
Segundo dados da Datamar, as importações da Rússia em granel sólido somaram 10,7 milhões de toneladas em 2021, o equivalente a cerca de 12% das importações em granel, que chegaram a 89 milhões de toneladas. “Desses, 60% foram fertilizantes e 38%, carvão”, diz Andrew Lorimer, CEO da Datamar.
Leandro Barreto, sócio da consultoria Solve Shipping Intelligence, destaca que o índice global de fretes vinha desacelerando de forma lenta, mas não caiu nem 10%. No Brasil, o custo caiu devido ao incremento de oferta com a entrada da Hyundai com um novo serviço China-Brasil. Para Eduardo Nery, da Antaq, o cenário é de incerteza, e a importação de fertilizantes e a exportação de proteínas e grãos são os principais pontos de atenção. Fernando Biral, diretor-presidente da SPA, diz que em Santos poderão haver reflexos na área de fertilizantes.
O porto prepara-se para a privatização com a casa arrumada, saindo de um prejuízo de R4 469 milhões em 2018 para o lucro recorde de R$ 329 milhões em 2021. Os atuais operadores portuários e ferroviários de Santos só poderão disputar a concessão no limite individual de 15% ou de 40% em consórcio. Biral diz que foram identificados mais de 80 potenciais investidores. Para este ano, está prevista ainda a licitação de seis áreas. O destaque é o STS 10, terminal de contêineres de 2,3 milhões de TEUs/ano, com edital em consulta pública e leilão previsto para o quarto trimestre.
Para Sepúlveda, da Santos Brasil, o terminal é desnecessário. Em 2021, a Santos Brasil operou em 85% de sua capacidade de 2,3 milhões de TEUs, que deve crescer para 2,6 milhões de TEUs em 2022, podendo chegar a 3 milhões, o suficiente para atender à demanda até 2035. A empresa cresceu 29,3%, para 1,91 milhão de TEUs, em 2021, e continua disputando com a BTP a liderança em Santos.
Ricardo Arten, CEO da BTP, diz que a empresa movimentou mais de 1,9 milhão de TEUs, operando acima da capacidade de 1,6 milhão de TEUs em 2021, o que aumenta a necessidade do projeto de expansão para 2,3 milhões de TEUs. A empresa é uma joint-venture dos operadores de terminais APM Terminals (Maerk) e Terminal Investment Limited – TIL (MSC), e, por ter entre seus controladores os dois maiores armadores do mundo, tem incomodado os terminais de contêineres em todo o Brasil.
Paulo Bertinetti, diretor-presidente do Tecon Rio Grande, condena o que diz ser concorrência desleal. O port, localizado a 320 quilômetros de Porto Alegre, tem boas condições, com calado de 15 metros apto a receber navios de 400 metros e se tornar o hub do Cone Sul. “Mas sofre concorrência de terminais de Santa Catarina, que pertencem aos nossos principais clientes, a Maerk e a MSC. A verticalização é saudável quando é para o negócio do dono da carga, porém não em toda a cadeia logística”, defende Bertinetti.
Diante da insatisfação, a ABTRA entrou em agosto de 2020 com uma ação no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) contra a BTP, alegando desequilíbrio concorrencial, e transformou a denúncia em inquérito administrativo em abril do ano passado. Em março deste ano, o mercado foi surpreendido pelo edital do novo terminal de contêineres de Santos, que proibiu a participação direta da BTP na licitação e dos dois controladores em consórcio, que poderão disputar o terminal apenas isoladamente. “Condenamos veementemente, pois isso limita a competição. Quando há restrição de um terminal, é ruim para o processo”, argumenta Arten, da BTP.
Com o desenvolvimento e retorno demorados, as privatizações portuárias ainda não atraem o interesse de fundos de infraestrutura, que preferem investir em projetos greenfield. “Investimos em São Francisco do Sul, Itapoá e num projeto em desenvolvimento. Em 2020, lançamos o BRZ Infraportos, fundo de investimento em infraestrutura, que pode fazer novas e rápidas captações”, diz Ricardo Propheta, CEO da BRZ, que opera com a XP Asset.
Além de Itapoá, os portos e terminais do Sul do país tiveram forte expansão. Thomas Lima, diretor comercial e institucional do Terminal de Contêineres de Paranaguá (TCP), informa que o terminal encerrou 2021 com a maior movimentação de contêineres de sua história, mais de 1 milhão de TEUs no ano. Primeiro TUP do país, Portonave também bateu, em 2021, a marca de 1 milhão de TEUs, a maior da sua história, com crescimento de 29%, e disputa cargas de Santos, Rio Grande e Rio de Janeiro, diz Rodrigo Gomes, gerente comercial da Portonave.






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