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17/07/2019 - 05h21

Ponte em Santos opõe terminais e governo Doria

Fonte: Valor Econômico


 
Um projeto do governo paulista e da Ecorodovias para construir uma ponte entre Santos e Guarujá gerou uma queda de braço no Porto de Santos. De um lado, operadores de terminais alegam que o projeto vai atrapalhar o trânsito de navios e criar restrições à expansão do cais. De outro, a concessionária defende que a ligação rodoviária trará melhorias ao tráfego na região.
 
A construção da ponte custaria R$ 2,9 bilhões. O valor seria desembolsado pela Ecovias, concessionária da Ecorodovias responsável pelo sistema Anchieta-Imigrantes, que liga a capital paulista ao litoral. Em troca, a empresa teria direito a uma prorrogação do contrato, que, a princípio, vence em 2026. A Ecovias é a principal concessão da Ecorodovias e responde por cerca de 40% da geração de caixa do grupo.
 
O projeto da ponte é antigo - surgiu nos anos de 1970 - e foi tirado da gaveta no fim do ano passado, por iniciativa do então governador Márcio França (PSB), que tem sua base eleitoral na Baixada Santista. A nova gestão, de João Doria (PSDB), abraçou o empreendimento, que, segundo analistas, conversa com o plano do tucano de prorrogar concessões rodoviárias, como forma de antecipar obras no Estado.
 
No entanto, companhias e entidades do setor reclamam que o processo tem sido tocado de forma excessivamente acelerada e pedem mais estudos.
 
"Qual o motivo dessa ponte? Até agora não está claro para ninguém", afirma Ricardo Arten, presidente da Brasil Terminal Portuário (BTP). O grupo seria um dos mais afetados pela construção da ponte, que estaria próxima à sua área de atuação e comprometeria seus planos de expansão em direção ao cais do Saboó. A empresa chegou a lançar uma campanha nas redes sociais questionando o empreendimento.
 
"Se a ideia for melhorar a mobilidade urbana e desafogar a travessia por balsas, a ponte não é o caminho, porque não vai atrair nem 30% do tráfego. Se for para resolver o transporte de carga, estaríamos indo na contramão do que o Estado fez, que foi o arco rodoviário [Cônego Domênico Rangoni] já construído para esse fim. Não somos contra o projeto, mas queremos mais discussões", diz.
 
Para críticos, a ponte poderá criar restrições ao trânsito de navios no canal do porto, principalmente por conta dos pilares de sustentação da obra. Há preocupação devido ao crescente porte das embarcações internacionais, que poderiam ter problemas no futuro para manobrar no local - o que requer mais espaço do que a simples passagem dos navios.
 
Além disso, há o temor de que a ponte prejudique os planos de expansão do porto, que tem projetos de ampliação da capacidade operacional - no terminal da BTP, de contêineres, mas também em outras áreas, como nos terminais de granéis líquidos na Ilha Barnabé.
 
"Qualquer intervenção permanente requer cautela. Falta aprimorar os estudos, para saber se as soluções são viáveis", avalia o presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), Jesualdo Conceição da Silva.


 
A Ecorodovias defende o projeto. "A ponte não cria nenhuma restrição, além das que já existem no porto", diz Nicolo Caffo, diretor de negócios rodoviários do grupo. Ele afirma que os espaços livres no canal após a construção seriam mais do que suficientes para a passagem dos maiores navios existentes no mundo, tanto em termos de altura como de largura.
 
O executivo também argumenta que a ponte aliviaria 40% de todo o tráfego de veículos de passeio que hoje fazem o trajeto pela rodovia Cônego Domênico Rangoni ou por balsa. No caso de veículos comerciais, a travessia desafogaria de 55% a 60% do fluxo na rodovia e reduziria o tempo de viagem de uma hora para dez minutos, afirma.
 
A passagem pela ponte teria cobrança de pedágio, com valor igual ao da Cônego. A ideia seria evitar o sobrecarregamento da ponte, afirma Caffo. "Em resumo, é uma análise que precisa ser técnica. Não dá para querer fazer nas redes sociais", diz, em referência à campanha da BTP.
 
A expectativa da Ecorodovias é que o projeto e as licenças ambientais fiquem prontos até o início de 2020, quando as obras já poderiam começar. A previsão é de três anos para a construção.
 
Ao criticar o projeto de ponte, a BTP propõe que, no lugar, seja feito uma travessia por meio de um túnel, que passaria por baixo do canal e faria ligação com a uma região central do Guarujá. Para Arten, essa opção não traria restrições à passagem dos navios e atenderia melhor o fluxo de carros de passeio entre as cidades.
 
Caffo, da Ecorodovias, argumenta de forma contrária: alega que o túnel seria mais caro, não resolveria o tráfego de caminhões e demandaria desapropriações de terrenos.
 
Além disso, diz ele, a Ecovias não poderia realizar a obra em troca de uma extensão do contrato nesse caso. "[O túnel] é um projeto de 2013 que, naturalmente, não poderia ser incluído no contrato da Ecovias, porque está fora das rodovias concessionadas e que, portanto, teria que ser feito com dinheiro público."
 
Segundo o Valor apurou, está em análise um arranjo jurídico que possibilitaria incluir a obra do túnel na concessão da Ecovias. Além disso, há estudos para minimizar o impacto de desapropriações e reduzir o valor do projeto - que no passado ganhou uma série de adendos que encareceram seu custo total. A projeção é que as obras demandem R$ R$ 3,2 bilhões, valor próximo ao da ponte.
 
Em meio à polêmica, o governo paulista vai realizar, hoje, em Santos, uma audiência pública em Santos para debater o projeto.
 
Procurado, o governo paulista disse, em nota, que "está empenhado em concretizar a 'ligação seca' entre Santos e Guarujá" e que segue em tratativas para definir o melhor projeto, ainda em análise pela Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) e no aguardo de licença ambiental.
 
A Artesp afirmou que analisa os estudos formulados pela Ecovias, "por determinação do poder concedente (Governo do Estado)".
 
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