Notícias

15/05/2018 - 20h23

Trabalho escravo: duas das maiores empresas incluídas na lista suja são retiradas em menos de dez dias

Fonte: O Globo
 
A Rumo Malha Paulista e a Sertenge têm atuação atrelada a programas do governo federal

 
Duas das maiores empresas incluídas na lista suja do trabalho escravo conseguiram sair da relação por decisões liminares da Justiça do Trabalho, menos de dez dias depois da inclusão. Os dois empreendimentos têm atuação atrelada a programas do governo federal. A Rumo Malha Paulista, com um capital de R$ 1,74 bilhão, está qualificada no programa de privatizações do governo para prorrogação antecipada da concessão de 2 mil quilômetros de ferrovias. A Sertenge S.A., uma empresa com capital de R$ 98,6 milhões, tem contratos com a Caixa Econômica Federal para projetos do Minha Casa Minha Vida.
 
A atualização da lista suja foi tornada pública em 10 de abril. Tinha inicialmente 165 empresas listadas, das quais 36 não estavam na versão anterior. O cadastro é atualizado a cada seis meses e um empregador só é incluído após o esgotamento dos recursos relacionados a autos de infração por exploração do trabalho em condições análogas à escravidão. A relação de nomes é divulgada no site do Ministério do Trabalho.
 
Apenas três dias depois, a Rumo – antiga ALL América Latina Logística Malha Paulista – conseguiu uma liminar da 83ª Vara do Trabalho de São Paulo para sair da lista. A decisão é sigilosa e não é divulgada nem pela Justiça nem pela empresa. Até a última quarta-feira, o Ministério Público do Trabalho (MPT) em São Paulo não havia sido comunicado oficialmente sobre a liminar, segundo o órgão.
 
Já a decisão favorável à Sertenge foi proferida pela 48ª Vara do Trabalho do Rio nove dias após o Ministério do Trabalho publicar a relação de nomes no site. Oficiada, a pasta retirou de imediato os nomes das duas empresas da lista suja.
 
Na liminar que retirou a Sertenge da lista, o juiz titular da 48ª Vara, Claudio Olimpio Lemos de Carvalho, usou a seguinte justificativa: “O Brasil vive momento extremamente delicado na sua cena pública. O Judiciário, o Legislativo e o Executivo, os três Poderes da República, têm sofrido justas e severas críticas de violação ao Estado Democrático de Direito, com atos carregados de pessoalidade, partidarismo e passionalidade. Navegamos em águas turbulentas.”
 
O magistrado prosseguiu na crítica: “E diante da gelatina pouco consistente que se tornou o Direito por aqui, atualmente ser republicano é atender a lei e a Constituição da República. A salvação está nos braços serenos das instituições, e não na cabeça de um ou outro iluminado.” A retirada da lista suja é “provisória”, conforme a liminar, até uma decisão final no processo. Além do Ministério do Trabalho, a Caixa também foi oficiada sobre a liminar, de forma que a empresa não fosse prejudicada nos empreendimentos do Minha Casa Minha Vida.
 
A lista suja registrava que a empresa explorou cinco trabalhadores em condições análogas à escravidão num empreendimento do Minha Casa no bairro Itaipuaçu, em Maricá (RJ) – o Residencial Carlos Marighella. O caso chegou à “irrecorribilidade” em maio de 2017, com a inclusão na lista em 10 de abril deste ano. A empresa pediu, então, a anulação de quatro autos de infração, alegando “uma série de vícios e ilegalidades”. A Caixa não pode contratar empresas incluídas na lista suja do trabalho escravo.
 
O juiz da 48ª Vara do Trabalho do Rio concordou com a existência de “evidente vício nos processos administrativos”. “A defesa apresentada pela empresa nos quatro processos administrativos não foi conhecida por ausência de comprovação de poderes daquele que outorgou a procuração aos advogados. Ou seja, uma questão desta magnitude não pôde ser discutida pela autora junto ao Ministério do Trabalho por uma questão de insignificante relevância”, escreveu o magistrado.
 
Uma prestadora de serviços contratada pela Sertenge seria a responsável por explorar o trabalho análogo à escravidão, segundo o juiz. “O alojamento onde foram encontrados os empregados não era da empresa autora, e nem se encontrava mais vigente o contrato de prestação de serviços”, escreveu o magistrado na liminar.
 
A exclusão da Rumo Malha Paulista, por sua vez, se deu por meio de uma decisão sigilosa. Fontes ouvidas pelo GLOBO dizem que a liminar aponta prejuízos à empresa e que seria necessário mais tempo para uma análise definitiva do caso, mas sem entrar no mérito da acusação.
 
Conforme os dados tornados públicos pela Secretaria de Inspeção do Trabalho do ministério, a Rumo foi autuada em 2010. O caso envolveu 51 trabalhadores em condições análogas à escravidão, com atuação na linha férrea de Santos a Mairinque, em São Paulo. A "irrecorribilidade" ocorreu em julho de 2015.
 
O Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do governo do presidente Michel Temer qualificou a Rumo Malha Paulista para a prorrogação do contrato em março de 2017. A antecipação dessa prorrogação deve ficar condicionada a investimentos em segurança e aumento de capacidade na malha férrea. Os investimentos estimados são da ordem de R$ 4,72 bilhões.
 
O principal destino das linhas operadas é o Porto de Santos. A outorga do projeto é calculada em R$ 1,28 bilhão. Em 2015 ocorre a fusão entre a ALL e a Rumo Logística. A empresa virou, então, Rumo Malha Paulista.
 
Em nota, a empresa afirmou que a inclusão da companhia na lista foi “totalmente equivocada”, uma vez que recursos apresentados pela antiga ALL ainda estariam pendentes de análise no ministério. “Os autos em questão foram lavrados em 2010, cinco anos antes da troca de gestão (em virtude da fusão da antiga ALL com a Rumo) e ainda estão sendo debatidos no Poder Judiciário e no MTE”, afirmou.
 
A Rumo não reconhece a responsabilidade pelo fato flagrado em 2010. “Os fatos decorrem de obra contratada pela ALL e de responsabilidade da empresa Prumo Engenharia Ltda., empresa idônea, fundada em 1978, que conta hoje com mais de 1,4 mil empregados.”
 
Imprimir Indique Comente

« Voltar

Galeria de
Imagens

Ver todas