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14/11/2017 - 06h17

Vai ter trabalho?

Fonte: IstoÉ Dinheiro
 
O temor gerado por uma cultura de anos de litígios nas relações com funcionários está reduzindo a disposição das empresas em abraçar a reforma trabalhista de imediato. Saiba o que falta para a modernização pegar de fato

 
Nos próximos dias, o empresário Sergio Gracia, sócio-fundador da fabricante de calçados Kidy, com 1.800 funcionários, vai procurar o sindicato dos trabalhadores para resgatar uma negociação histórica. A redução no horário de almoço, com equivalente antecipação do fim do expediente, sempre foi um desejo mútuo entre as partes. Nunca avançou por temor de que a Justiça do Trabalho anulasse o acordo. Com a entrada em vigor da reforma trabalhista, a partir de sábado 11, Gracia sente-se confiante para avançar no tema, já que o texto deixa claro que a flexibilização é possível. Se concordarem com a mudança, os trabalhadores da unidade de Mato Grosso do Sul, uma das três do grupo, poderão voltar até uma hora antes para casa.
 
A redução de uma hora e meia para meia hora na pausa de almoço fará com que o turno termine às 16h08 e não mais às 17h08, aumentando a qualidade de vida e a produtividade. Além disso, pode atrair jovens ao setor, um desafio atual das fabricantes. Entre as alterações previstas estão ainda a jornada 12×36 em partes da operação e a terceirização em áreas administrativas. Algumas delas, porém, devem esperar até que fique claro se os riscos judiciais estão mesmo descartados. “Temos de nos precaver porque tudo é muito novo”, diz Gracia. “Não sabemos como será a reação da Justiça e do sindicato.”
 
Na maior parte das empresas, o anseio é grande para adotar as normas mais modernas na relação de trabalho. Afinal, a vigência do novo texto representa a principal grande mudança desde que a Consolidação das Leis Trabalhistas foi elaborada, há mais de 70 anos, ainda na Era Getúlio Vargas. Mais flexibilidade significaria uma alocação mais eficiente de recursos, maior competitividade, menos custos – em especial o advindo da enxurrada de processos – e, como consequência, uma potencial geração de vagas. Mas a cultura de anos de litígio entre as partes e a resistência de alguns atores em incorporar o novo texto ameaçam emperrar a nova etapa e motivam uma dose extra de cautela. Criou-se uma dúvida em torno da reforma comum a novas leis no Brasil: será que vai pegar?
 
As incertezas são tantas que surge o risco de um efeito contrário da reforma no primeiro momento: aumentar, em vez de diminuir, o volume de ações trabalhistas. Mais de três milhões de novos processos são ajuizados todo ano na Justiça do Trabalho, o que coloca o país como um dos mais litigantes no tema. “Em geral, temos hoje de 100 a 1.000 vezes mais processo do que outros países”, afirma Antonio Megale, presidente da associação das montadoras (Anfavea) sobre a situação do setor. “Não vai ser de hoje para amanhã que as coisas vão mudar.” Nas montadoras, a tradição de negociações com o sindicato é citada como diferencial capaz de contribuir para fazer valer uma das alterações mais esperadas pelas empresas: a da prevalência do negociado sobre o legislado, em que os acordos tendem a ter mais força do que a lei. Assim como no caso da calçadista, a primeira novidade será a redução do almoço e a saída mais cedo.
 
O temor envolve temas-chave da reforma. Há dúvidas sobre até que ponto será possível terceirizar, capítulo no qual o texto buscou esclarecer melhor a permissão para atividades-fim; sobre as condições em que não haverá problema adotar o trabalho intermitente, em que o funcionário recebe por hora; sobre a não incidência de encargos em premiações e bonificações, além de outros. “A discussão que deveria ter sido terminada com a sanção presidencial não terminou”, afirma Claudio Hermolin, presidente da Associação dos Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi) e CEO da Brasil Brokers. “Tem órgãos de classe e sindicatos questionando a legalidade da reforma trabalhista.” Na sua empresa, por exemplo, os estudos estão mais avançados na adoção de trabalho remoto. A percepção de dúvidas é recorrente. “O nível de incerteza ainda persiste”, diz Flavio Amary, presidente do sindicato da habitação (Secovi-SP). “Esse conjunto de normas é importante porque vai trazer de volta o incentivo ao emprego.” Numa tentativa de reduzir as dúvidas, o setor voltará a debater o tema num seminário em Brasília, nos dias 30 e 1º de dezembro.
 
CORPORATIVISMO A confusão é acentuada por diversos motivos, desde ações ajuizadas pela Procuradoria alegando a inconstitucionalidade do texto até declarações de juízes e dirigentes sindicais. A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) divulgou uma lista dos temas dos quais discorda da reforma. Entre eles, a cláusula que estabelece uma referência com base no salário do trabalhador para as indenizações de dano moral, a que abre a possibilidade de o funcionário arcar com as custas do processo, além da terceirização e da jornada intermitente. Trata-se de uma sinalização dos juízes de que, se confrontados em processos, adotarão interpretação contrária ao texto. “A lei foi aprovada com pouco debate”, afirma Guilherme Feliciano, presidente da Anamatra. “O resultado disso é uma lei com vários vícios e inconstitucionalidades.”
 
A reação dos magistrados indica uma atitude corporativista, uma vez que a tendência é de que os acordos entre trabalhadores e empresas reduzam o papel do Judiciário. “Um dos propósitos da reforma é diminuir o ativismo judicial”, diz Elton Duarte Batalha, professor de Direito Trabalhista da Universidade Mackenzie. “É natural haver uma resistência.” Ao todo, o Brasil possui 1.570 varas do trabalho e 3.332 juízes especializados no tema (leia quadro na pág. 34). Para o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra da Silva Martins Filho, a reforma vai melhorar o trabalho do Judiciário. “Vamos julgar só as causas mais relevantes”, afirmou em entrevista à Folha de S. Paulo.
 
Os sindicatos também relutam em aceitar certas mudanças. Os trabalhadores do comércio em São Paulo, por exemplo, negociaram salvaguardas com os patrões adiando, até fevereiro, a aplicação de trabalho intermitente e tipos de terceirização. A esperança de ambos é que o governo cumpra a promessa de editar uma Medida Provisória esclarecendo e atenuando certas propostas. “Para os sindicatos dos comerciários, a lei não vai vigorar este ano”, afirma Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT). A esperança é de correções tais como limitar o trabalho intermitente a 10% dos funcionários, exclusivamente para quem está no primeiro emprego ou é aposentado.
 
Se as mudanças não vierem via Legislativo, Patah convida as empresas a fazerem os ajustes via acordo. “Independentemente da nossa indignação, vamos negociar”, afirma. “Não dá para ficar debatendo quando temos 14 milhões de desempregados.” Pesa contra também a memória de empresários acostumados com a litigância e uma visão cética sobre a Justiça acumulada ao longo dos anos. “Não há nada que faça o contencioso no Brasil diminuir, a não ser um pacto social”, afirma José Carlos Wahle, sócio da área Trabalhista do Veirano Advogados. “Juízes, empregados, empregadores e sindicatos precisam parar de desconfiar um dos outros e partir do pressuposto de que todos agem de boa fé até que se prove o contrário.” Se é isso o necessário para que a reforma trabalhista pegue de vez, é impossível estimar quanto tempo levará até que ela gere o seu pN o vaivém político de Brasília, numa mesma semana um projeto pelo qual o governo batalhou por meses pode parecer morto e, em poucos dias, voltar à vida.
 
A reforma da Previdência era a principal aposta do presidente Michel Temer para reverter a trajetória de avanço da dívida pública e afastar o risco de insolvência do país no longo prazo. Diante da dificuldade de avançar com a apreciação no Congresso, Temer admitiu na segunda-feira 6 um eventual fracasso na votação. “Se em um dado momento, a sociedade não quer a reforma da Previdência, a mídia não quer e a combate e, naturalmente, o parlamento que ecoa as vozes da sociedade também não quiser aprová-la, paciência”, afirmou Temer em reunião com ministros e representantes da base no Palácio do Planalto. A declaração gerou um mal estar no mercado financeiro. No dia seguinte, a Bolsa recuou 2,55% e o dólar avançou 0,55%, com investidores destacando a fala do presidente.
 
A equipe econômica tentou minimizar o dano reforçando a mensagem de que o texto segue vivo. Após reuniões com líderes do Congresso, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, sinalizou a importância de avançar neste ano, antes do calendário eleitoral, mesmo que seja preciso um texto mais tímido. O governo admite agora flexibilizar o projeto em diversos pontos e espera agora metade da economia prevista aos cofres públicos. O relator do projeto, Arthur Maia (PPS-BA) admitiu que deve cair o trecho que elevava de 15 anos para 25 anos o tempo mínimo de contribuição – uma das mudanças mais duras do texto – e alterações nas regras da aposentadoria rural.O governo deve batalhar para manter a criação da idade mínima de 65 anos para homens, de 62 anos para mulheres e a equiparação nas regras entre servidores públicos e o setor privado.
 
Em relatório, o banco Santander sinaliza que as negociações mais realistas em torno do texto podem ser uma surpresa positiva, uma vez que a deterioração política observada a partir de junho já havia feito investidores interpretar a aprovação apenas em 2019. “Isso significa que vemos uma tendência positiva para o preço das ações caso o Congresso avance num acordo.” Ao mesmo tempo, a equipe de análise lembra que o risco negativo de que a reforma fique para 2019 segue presente e, portanto, atrelado ao resultado das eleições presidenciais do ano que vem.rincipal efeito ao país: mais empregos.

 
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